Robôs que auxiliam equipes médicas em cirurgias já são realidade há anos em hospitais do mundo inteiro. Porém, no Brasil, o custo dos equipamentos, ainda importados de outros países, pode ser um empecilho para o sistema público de saúde. Pesquisadores da Universidade de Brasília querem tornar viável a disponibilização dessas tecnologias nas Unidades de Saúde a partir do desenvolvimento de um robô de baixo custo para auxiliar no procedimento da laparoscopia, incisão pouco invasiva indicada principalmente para remoção de vesícula e apêndice.
O projeto CLARA, parceria entre UnB e Ministério da Saúde, propõe a montagem de um protótipo, controlado pelo cirurgião, responsável por segurar e manipular automaticamente o endoscópio utilizado durante a cirurgia. Estão envolvidos na elaboração do robô professores, estudantes de graduação, mestrado e doutorado do Laboratório de Robótica e Automação (LARA) e dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia de Sistemas Eletrônicos e de Automação da Faculdade de Tecnologia (FT) e de Engenharia Biomédica da Faculdade do Gama.
A demanda partiu do ministério, que, por meio de acordo de cooperação estabelecido com a UnB, solicitou aos pesquisadores um produto com tecnologia nacional que atendesse às atuais necessidades do Sistema Único de Saúde (SUS).
“O protótipo que estamos construindo é composto de um mecanismo motorizado que movimenta um endoscópio a partir de comandos do cirurgião, que podem ser realizados por meio de um joystick bluetooth acoplado à ferramenta ou por meio de voz”, explica a coordenadora do projeto e professora da FT, Mariana Bernardes. Outra função disponível possibilitará a centralização automática da imagem captada pelo endoscópio, a partir do rastreamento da posição da câmera nas imagens de vídeo.
Convencionalmente, são necessários dois médicos para efetuar a cirurgia laparoscópica. Um cirurgião realiza a intervenção e outro é responsável por manipular o endoscópio, câmera introduzida na região abdominal durante o procedimento. Segundo Bernardes, uma das vantagens da introdução dos robôs em cirurgias é a facilidade trazida, já que permite que o médico auxiliar desempenhe outras funções em vez de segurar por várias horas a câmera – o que além de ser exaustivo, também pode interferir na precisão do procedimento. “Além de trazer conforto para ambos os cirurgiões, facilita e também melhora o desempenho da operação”, avalia a professora.
Apesar de já existirem robôs capazes de dar suporte na realização dessas incisões mais delicadas, eles ainda não são fabricados no Brasil e o preço de aquisição varia entre R$ 1,5 milhão e R$ 3 milhões. O investimento pode ser ainda maior, se contabilizadas outras demandas como a capacitação de profissionais para utilização e manutenção dos equipamentos.
CONSTRUÇÃO – Desde 2012, os pesquisadores da UnB estão envolvidos no desenvolvimento do robô cirúrgico, cujo processo de montagem está sendo realizado em etapas. A primeira delas consistiu no estudo de técnicas de controle do robô para utilização do endoscópio. Na sequência, deu-se início à criação dos módulos do protótipo, que, quando concluídos, serão ajustados uns ao outros.
“Os módulos são integrados através de uma interface gráfica, na qual o cirurgião pode configurar e ajustar parâmetros do sistema de acordo com suas preferências e com o procedimento que irá realizar”, aponta a professora. Para garantir a segurança e a eficácia do produto, testes no sistema de comunicação estão sendo realizados em um aparelho que se assemelha à anatomia do abdômen humano. A previsão é de que o primeiro protótipo do CLARA seja finalizado até o final de 2016 e disponibilizado, por meio de parcerias, para experimentos com médicos.
SIMULADOR – Também está em elaboração um simulador cirúrgico para que os usuários possam fazer uma espécie de treinamento em ambiente virtual até finalmente estarem aptos a utilizar o equipamento na prática. A estudante do curso de Engenharia Elétrica, Fernanda Amaral Melo, integra a equipe responsável por desenvolver o simulador. Segundo ela, a tecnologia poderá ser baixada pelo celular e testada com um joystick acoplado. “O simulador vai servir para a difusão do produto, principalmente no momento inicial, para que possa ser bem aceito entre os profissionais”, explica.
A experiência, além de contribuir na formação da aluna, tem rendido bons frutos: ela foi selecionada recentemente, entre graduandos de diversos países, para participar do projeto de um pesquisador da Universidade Karlstad, na Suécia, para desenvolver outro robô. Desta vez, será um protótipo para auxiliar idosos e seus cuidadores em atividades do dia a dia.
Melo acredita que o intercâmbio, de agosto a dezembro deste ano, será uma oportunidade para aprimorar os conhecimentos na área de biomedicina.“Vai ser algo bem engrandecedor, pois vou aprender coisas que vão me ajudar no projeto de TCC e vou ter acesso a aparelhos de ponta e a um professor com muita experiência na área”, destaca a graduanda.
UnB, agosto 2016