O Brasil tem acordos para vacina de Covid-19 com diversos potenciais fornecedores. Refiro-me a “potenciais”, pois ainda não temos nenhuma vacina que tenha completados os testes de Fase 3 e tenha sido aprovada em seu país de origem nem no Brasil pela Anvisa. A Fiocruz estabeleceu acordo com a vacina da AstraZeneca/ Universidade de Oxford; o Instituto Butantã está em acordos com a empresa chinesa CanSino Biologics; o Instituto Tecnológico do Paraná (TECPAR) anunciou entendimentos com o Instituto Gamaleya, do governo da Rússia, e o Governo Federal anunciou adesão à iniciativa COVAX, iniciativa que está prometendo fornecer vacinas de diversos potenciais produtores. Com essas perspectivas, esperamos, no futuro próximo, ter disponibilidade de vacinas de mais de uma fonte e em quantitativos suficientes para atender todas nossas necessidades ao longo de 2021. Não há nenhuma garantia absoluta, pois ainda não há vacina aprovada, mas esperamos que os resultados dos ensaios clínicos correspondam  às  nossas expectativas.

Para a distribuição equânime da vacina no Brasil, esperamos contar com a experiência acumulada pelos técnicos do Programa Nacional de Imunizações, considerando a realidade brasileira e a necessidade de rede de frio para conservação da vacina. [ A Rede de frio é o processo de recebimento, armazenamento, conservação, manipulação, distribuição e transporte dos imunobiológicos do Programa Nacional de Imunizações (PNI). O objetivo da Rede de Frio é assegurar que todos os imunobiológicos mantenham suas características imunogênicas desde o laboratório produtor até o momento de sua utilização].

Esperamos contar com a infraestrutura e a logística necessárias para tal (vacinadores, transportes, caixas isotérmicas, seringas e agulhas, etc). É preciso fortalecer nosso Sistema Único de Saúde (SUS), pois toda a vacinação deve ser inserida no nosso sistema público reconhecido mundialmente. Em termos de priorizar grupos a serem vacinados inicialmente, deve haver transparência na definição de critérios, incluindo pessoas de grupos de risco, como idosos, profissionais de saúde, portadores de comorbidades, pessoal da linha de frente de atendimento público (motoristas de transportes públicos, profissioais que trabalham com atendimento em estabelecimentos comerciais, forças policiais, etc). Coloco estes apenas como exemplos, pois os critérios devem ser definidos coletivamente nos campos da Saúde Coletiva. A população deve receber toda a orientação necessária sobre a vacinação, ainda mais considerando que potencialmente podemos ter mais de uma vacina de tecnologias diferentes no Brasil.

A discussão mundial que deve pautar nossa conduta no Brasil é considerar a vacina e as tecnologias em saúde relacionadas com a pandemia como “bens públicos globais”, impedindo a especulação ou a exploração de preços abusivos, já que nosso SUS é baseado em princípios que incluem a equidade e integralidade, adotando a Saúde como direito de todos e dever do Estado. Da mesma maneira, esperamos que o “novo normal” pós-pandemia nos coloque com maior solidariedade a partir das lições aprendidas neste período.

* Jorge Bermudez é pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz) e membro do Painel de Alto Nível em Acesso a Medicamentos do Secretário-geral das Nações Unidas.

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Fonte: CEE/Fiocruz