Os Estados precisam ampliar seu comprometimento em garantir o acesso a serviços de água e saneamento para as populações, tal como previsto pelas resoluções internacionais, afirmou nesta quarta-feira (22), Dia Mundial da Água, o relator especial da ONU para o direito à água e ao saneamento, o brasileiro Leo Heller.
Em entrevista à ONU News, Heller declarou que são múltiplos os desafios enfrentados para garantir o direito à água e ao saneamento de forma efetiva no mundo. “Exige forte comprometimento dos Estados. Exige um novo olhar para a implementação das políticas de água e saneamento, que devem ser lastreadas nos princípios dos direitos humanos”, declarou.
Segundo o especialista, os países têm trabalhado suas políticas de água e saneamento “de forma mais tecnocrática”, o que não é suficiente para abranger as dimensões da acessibilidade financeira, da não discriminação, do direito à informação, do direito à participação, entre outros aspectos.
“Sem dúvida houve progressos, se olharmos os ODM (Objetivos de Desenvolvimento do Milênio), houve avanços entre 2000 e 2015, tanto na água como no saneamento”, declarou. “Mas também enxergamos um grande contingente da população mundial sem acesso adequado”, completou.
Os dados de monitoramento dos ODM mostraram que cerca de 700 milhões de pessoas no mundo não têm acesso a água segura e 2,5 bilhões não têm saneamento adequado. Além disso, quase 1 bilhão de pessoas defecam a céu aberto.
“São desafios que a Agenda 2030 terá que enfrentar com maior comprometimento dos governos. Os governos têm se comprometido, não de forma homogênea, mas a nova agenda vai impor um comprometimento muito determinado dos vários Estados para avançar mais nesse aspecto e eliminar esse enorme déficit.”
Sobre o Brasil, o especialista afirmou que existe a necessidade de aperfeiçoamento das políticas públicas, que precisam ser contínuas, e de ênfase no acesso da população rural à água e ao saneamento.
Cooperação internacional
Em comunicado publicado na terça-feira (21), o relator especial da ONU chamou todos os envolvidos em cooperação para o desenvolvimento a trabalharem juntos para garantir que o direito humano a esses serviços estejam disponíveis a todos.
O apelo teve como intenção levar luz ao papel-chave da cooperação para o desenvolvimento — esforço internacional conjunto para apoiar países em dificuldades socioeconômicas — na garantia dos direitos à água e ao saneamento.
“A cooperação para o desenvolvimento é um elemento crucial no financiamento desses serviços em muitos países em desenvolvimento e parece estar aumentando de acordo com os compromissos firmados na Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável”.
Apesar de muitos Estados e organizações multilaterais terem declarado sua intenção de garantir o direito à água e ao saneamento por meio da cooperação para o desenvolvimento, o relator especial afirma que “uma abordagem baseada em direitos humanos em programas e projetos de desenvolvimento parece ser mais a exceção do que a regra”.
“Está claro que a cooperação para o desenvolvimento pode estabelecer um parâmetro para aqueles envolvidos no setor de água e saneamento, incluindo governos de países em desenvolvimento que façam parte dessas parcerias”, disse Heller.
“Se tais iniciativas forem guiadas por uma abordagem de direitos humanos, elas podem contribuir para a conquista dos direitos à água e ao saneamento. Caso contrário, elas terão impacto negativo.”
O relator especial pede um conjunto de diretrizes solidamente baseado em direitos humanos, priorizando projetos que beneficiem os mais pobres e apoiando Estados a progressivamente garantir esses direitos.
“Para que os resultados sejam efetivos e sustentáveis, os Estados precisam de fortes políticas e diretrizes legais e regulatórias. A cooperação para o desenvolvimento, portanto, precisa focar em atividades que fortaleçam capacidades, que fortaleçam as comunidades locais”, completou.
“O financiamento para a cooperação para o desenvolvimento está crescendo, mas a água geralmente recebe mais dinheiro que o saneamento”, disse Heller. “Grandes sistemas recebem regularmente cerca de duas vezes mais que os pequenos, sugerindo que as áreas urbanas estão sendo favorecidas em detrimento das rurais”.
O relator especial está conduzindo mais pesquisas envolvendo conversas com atores-chave, assim como visitas a campo. Suas conclusões e recomendações serão publicadas em relatório a ser apresentado à Assembleia Geral da ONU em outubro.
Fonte: ONU Brasil