A América Latina reúne algumas das mais exuberantes fontes de recursos naturais do planeta: grandes reservas de minerais estratégicos e de petróleo, fronteiras agriculturáveis de proporções continentais, aliando disponibilidade de terras, sol e recursos hídricos, e os maiores aquíferos de água doce e potável, entre outras riquezas. Como, então, aproveitar todo esse potencial de maneira sustentável e em benefício do desenvolvimento da região e de sua população?

A questão foi tratada durante a mesa-redonda “O Futuro Tecnológico e Ambiental da América Latina”, no II Simpósio Internacional Pensar e Repensar a América Latina, promovido de 17 a 21 de outubro pelo Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina (Prolam) da Universidade de São Paulo (USP). À frente das discussões estiveram José Goldemberg, presidente da FAPESP, e Ildo Luis Sauer, vice-diretor do Instituto de Energia e Ambiente da USP e ex-diretor executivo da Petrobras.

Para Goldemberg, o desenvolvimento científico e tecnológico é fundamental para que não haja contradições entre crescimento econômico e preservação ambiental.

“Num cenário desejável de desenvolvimento de baixo carbono, a América Latina pode ser uma liderança no mundo tendo o Brasil à sua frente no processo, um dos poucos países em todo o globo que pode ser autossuficiente em energia. Mas esse potencial de desenvolvimento sustentável não pode se realizar se não forem feitos os devidos investimentos em planejamento, ciência e tecnologia, além da educação da população”, afirmou.

De acordo com Goldemberg, só a partir do século 20 a necessidade de tecnologia passou a ser percebida como urgente para o desenvolvimento nacional na América Latina.

“Os colonizadores traziam a tecnologia de que precisavam e isso se prolongou durante séculos – o pensamento era de que a colônia não precisava de desenvolvimento tecnológico. Ao longo de todo esse tempo, o meio ambiente foi sendo extremamente prejudicado por atividades extrativas. À medida que o sentimento de nação fica mais forte, cresce no país a necessidade de investimento e autonomia em ciência e tecnologia”, disse.

Ildo Luis Sauer destacou a crise econômica pela qual muitos países da região passam. “A América Latina está em crise após um período de exuberância e de excedente econômico propiciado de maneira inesperada, com aumento do preço dos produtos primários – minérios, produtos agrícolas, petróleo e outros. O grande desafio está em conseguir, a partir do seu dote de recursos naturais, que é relevante, de sua capacidade de recursos humanos e da sua capacitação tecnológica, construir relações novas capazes de aumentar a produtividade social do trabalho”, avaliou.

Entre esses dotes está a concentração no Brasil de 12% de toda a água potável do planeta, uma parte na superfície e outra grande parcela em reservatórios subterrâneos, os aquíferos. O Sistema Aquífero Grande Amazônia, o maior do mundo, localizado sob os estados do Pará, Amapá e Amazonas, tem 162.520 km³ de água, que poderia abastecer toda a população do planeta durante 250 anos. Já o Guarani é o maior aquífero transfronteiriço, abrangendo Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, e tem extensão territorial de 45.00 km3, dos quais 70% estão em território brasileiro.

“É preciso que sejam discutidas as relações entre tecnologia, proteção ambiental e apropriação dos recursos naturais. Para isso, é necessário ampliar muito o nível educacional da maior parte dos países e continuar aprofundando o desenvolvimento tecnológico, para que essa dotação de recursos possa permitir um novo incremento da produção de valor na região. Assim, no sistema político e institucional esse aumento na produtividade poderá se traduzir em maiores benefícios para toda a população da região, reduzindo as assimetrias que ainda marcam de maneira vergonhosa as diferenças entre os miseráveis e os afluentes”, disse Sauer.

A mesa-redonda contou com a mediação de Lisbeth Ruth Rebollo Gonçalves, coordenadora do Prolam, que destacou os impactos do desenvolvimento tecnológico nas culturas locais.

“A tecnologia tem um impacto vital sobre a cultura e não há como dissociar os traços culturais de cada nação latino-americana da realidade tecnológica global atual, que conecta pessoas e realidades. Trata-se de um espaço altamente produtivo e que também precisa ser alvo de reflexões”, disse a pesquisadora.

Mais informações sobre o II Simpósio Internacional Pensar e Repensar a América Latina em sites.usp.br/prolam.

Fapesp