A Fiocruz completa 120 anos nesta segunda-feira (25/5). A data chega no momento em que o Brasil e o mundo enfrentam o maior desafio sanitário, econômico, social, humanitário e político do século 21, a pandemia da Covid-19. Com o nome de Instituto Soroterápico Federal, a instituição foi criada com o objetivo de combater epidemias como a da peste bubônica, da febre amarela e da varíola, que ameaçavam a então capital da República, o Rio de Janeiro. Mais de um século depois, agora na pandemia do novo coronavírus, a atual Fundação Oswaldo Cruz, maior instituição de pesquisa biomédica da América Latina, continua na linha de frente do enfrentamento das doenças. A presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima, afirma que “a Fundação, presente em todas as regiões brasileiras, vem se dedicando diuturnamente a apresentar propostas e soluções, a elaborar pesquisas que respondam a perguntas ainda sem resposta, a formular e implantar ações estratégicas de atenção e promoção da saúde, como a construção do Centro Hospitalar para a Pandemia Covid-19, uma ação de referência com o Ministério da Saúde, entre muitas outras iniciativas”. Ela acrescenta que “ao completar 120 anos a Fiocruz reafirma o seu compromisso com o SUS, a grande fortaleza que o Brasil tem neste momento, e que precisa ser fortalecido, e reafirma seu compromisso com ações que se voltem para a defesa da vida e da população”. Nesta segunda-feira, às, 10h, a presidente participará de um debate virtual sobre os 120 anos da Fiocruz e a defesa da vida no canal da Fundação no YouTube, com a presença de representantes de instituições da saúde e da sociedade civil.

Nísia recorda que “desde o início do século 20 e da grande obra de Oswaldo Cruz, Carlos Chagas e tantos outros cientistas, que enfrentaram as epidemias da época e as então chamadas Doenças do Sertão, que eram as enfermidades do Brasil profundo, como a doença de Chagas, nossa instituição é um patrimônio do país porque revela o valor da ciência dedicada a resolver as grandes questões da vida dos brasileiros. E hoje não só dos brasileiros, uma vez que nossas contribuições, incluindo aquelas relacionadas à pandemia do novo coronavírus, têm uma abrangência internacional”.

Nísia ressalta que a doença não será a mesma em todos os lugares. “No Brasil, o maior desafio consiste na desigualdade social expressa nos mais diferentes indicadores: alta taxa de desemprego e trabalho informal e condições precárias de moradia, com habitações sem acesso ao saneamento. Acrescente-se a alta prevalência de doenças crônicas entre os maiores de 18 anos, o que implica a presença de fatores de risco para um terço da população e o consequente rejuvenescimento da Covid-19. Não menos importantes são as desigualdades regionais, especialmente no que se refere ao acesso a leitos de UTI”. Para Nísia, “o momento requer solidariedade, participação ativa da sociedade e forte presença do Estado. Salvar vidas, fortalecer o SUS e, como parte dele, o Complexo Econômico e Industrial da Saúde, são os desafios que se impõem à instituição e à sociedade brasileira’’.

A presidente observa que o enfrentamento da emergência reforça o compromisso da Fiocruz com as orientações máximas de seu VIII Congresso Interno. Entre elas, ser uma Instituição Pública Estratégica de Estado para a Saúde, voltada para o fortalecimento do sistema de vigilância nacional; que põe sua capacidade de desenvolvimento tecnológico e inovação para a sustentabilidade e a efetividade do SUS no enfrentamento dos desafios do Complexo Econômico-Industrial da Saúde; e atua baseada nos conceitos de diplomacia da saúde e ciência e tecnologia em saúde no contexto da saúde global. “Essa capacidade de desenvolvimento tecnológico e inovação é que nos permite ter, por exemplo, uma base científica em testes moleculares para diagnóstico, que dará condições à Fiocruz de produzir 11,6 milhões de testes moleculares até setembro, contribuindo para maior velocidade no processamento de análises de amostras através de centrais analíticas, em apoio aos laboratórios centrais dos estados”.

Entre as ações da Fundação no enfrentamento ao novo coronavírus está o já citado Centro Hospitalar para a Pandemia Covid-19, integrado ao Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz), que terá 195 leitos hospitalares, sendo 120 de unidade de terapia intensiva (UTI) e 75 de semi-intensivo, para atendimento de pacientes graves acometidos pela Sars-CoV-2 no Rio de Janeiro. Outra ação importante é o ensaio clínico mundial Solidariedade, da OMS, coordenado pela Fiocruz no Brasil com apoio do Ministério da Saúde. O estudo prevê uma redução em 80% do tempo para geração de evidências sobre os tratamentos e será realizado em 18 hospitais de 12 estados. O objetivo do estudo é dar uma resposta rápida sobre quais medicamentos são eficazes no tratamento da Covid-19 e quais são ineficazes e não devem ser utilizados.

Além dessas, outras iniciativas importantes diante da pandemia são projetos na área de vacinas, já que o Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fiocruz) vem fazendo a prospecção de potenciais parcerias, tendo como base as competências tecnológicas destes candidatos a parceiros (hoje existem 106 estudos em curso). Há também outra frente, na qual pesquisadores da Fiocruz Minas integram uma rede do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Vacinas para o desenvolvimento de uma vacina contra o novo coronavírus. O estudo terá como base uma técnica elaborada na Fiocruz Minas que utiliza o vírus da influenza para gerar resposta uma imunológica.

Em relação à integração de dados, foram criados o Observatório Covid-19, que desenvolve análises integradas (cenários epidemiológicos; impactos sociais da pandemia; medidas de controle e serviços de saúde; qualidade do cuidado e segurança); a Rede Covida – Ciência, Informação e Solidariedade para o monitoramento e produção de sínteses de evidências científicas; o Infogripe, que acompanha os níveis de alerta para os casos reportados de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG); e o MonitoraCovid-19, um painel com estimativa da situação do Brasil e unidades federativas baseada no número de casos e óbitos notificados – e em cenários de outros países.

A presidente diz que todas essas ações dos dias de hoje se conectam com o robusto legado de Oswaldo Cruz, que foi a formatação de uma instituição que alia ciência, tecnologia (na fabricação de produtos biológicos, como vacinas e fármacos), educação, saúde e projetos nacionais. “Uma marca histórica da Fiocruz, e por isso muito forte, tem origem nessa matriz institucional desenhada pela primeira geração de cientistas que Oswaldo Cruz reuniu em Manguinhos, ou seja, o nosso compromisso com a apropriação dos conhecimentos aqui gerados para a formulação de políticas públicas de saúde”.

Nísia comenta que o Instituto Soroterápico Federal, fundado em 1900, e transformado em 1908 em Instituto Oswaldo Cruz, foi criado como resposta a uma grande emergência sanitária: a necessidade de produzir soro contra a peste bubônica que havia chegado a Santos e ameaçava a então capital federal, o Rio de Janeiro. Oswaldo Cruz, como diretor do Instituto Oswaldo Cruz e diretor-geral de Saúde Pública, ampliou a agenda de pesquisa institucional e induziu produção de conhecimento em áreas diversas, como a microbiologia e a medicina tropical, tornando a instituição capaz de atuar também no controle à epidemia de febre amarela que assolava o Rio de Janeiro no início do século 20.

Nísia diz que o Instituto Nacional de Infectologia (INI/Fiocruz), que agora incorpora o Centro Hospitalar para a Pandemia Covid-19, faz lembrar que a instituição esteve à frente do combate à gripe espanhola, com Carlos Chagas liderando o esforço. Como na pandemia de hoje, a gripe espanhola também tinha na quarentena e no isolamento a sua principal forma de combate. E foi durante a epidemia que ocorreu a fundação do hospital que se tornou o INI.

A matriz institucional criada por Oswaldo Cruz, de acordo com a presidente, não se revela apenas na trajetória contínua que chega aos nossos dias nas diversas atribuições institucionais em pesquisa, produção e ensino, ou nos episódios de epidemias, na capacidade de responder a uma emergência sanitária. Outro traço histórico muito relevante e fruto dessa matriz é a presença nacional da Fiocruz. Hoje existem unidades da Fundação em todas as regiões do Brasil. Mas a presença da instituição no território brasileiro começou com expedições científicas, também nas primeiras décadas do século 20, que acompanharam a expansão do Estado nacional em obras para a modernização de sua infraestrutura, ou seja, construção de ferrovias, projetos de desenvolvimento regional na Amazônia, obras contra as secas no Nordeste etc. A base institucional permitiu a conjugação entre pesquisa de laboratório, trabalho clínico e expertise para trabalho de campo feito nos canteiros de obras.

“O papel da instituição nessas expedições foi fundamental para consolidar a medicina tropical como disciplina científica, mas também para fortalecer o seu protagonismo nos debates referentes à saúde pública, como no movimento sanitarista dos anos 1920, que buscava a implementação de políticas federais de saúde, como a criação de um Ministério da Saúde, e na formulação de projetos nacionais de desenvolvimento. Em suma, essa é a matriz que nos orgulha, inspira e desafia a aprimorar a instituição e suas diferentes áreas de atuação, para a promoção da saúde da população, o fortalecimento do SUS e de políticas de C&T&I e do desenvolvimento autônomo do país”, salienta Nísia.

“Mais de um século depois, a Fiocruz continua empenhada e capacitada a dar respostas à sociedade brasileira, na forma de conhecimento científico, insumos e atenção primária à saúde e nas situações de emergência sanitária, como vimos há poucos anos no caso gravíssimo da tríplice epidemia de dengue, zika e chicungunya e na reemergência da febre amarela. E vemos hoje na pandemia de Covid-19”. Para a presidente, “a lição maior de Oswaldo Cruz e de nossos grandes fundadores é o olhar para frente como base para a nossa ação no presente. É tratar esta diversidade do país como riqueza. É aproveitar a pulsão inovadora de nosso povo excluído, mas ao qual não faltam luta e criatividade”.

Fiocruz hoje

Desde as suas origens, a Fiocruz constituiu-se como centro de conhecimento da realidade do país e de valorização da medicina experimental. Hoje vinculada ao Ministério da Saúde, abriga atividades que incluem pesquisas; prestação de serviços hospitalares e ambulatoriais de referência em saúde; fabricação de vacinas, medicamentos, reagentes e kits de diagnóstico; ensino e formação de recursos humanos; informação e comunicação em saúde, ciência e tecnologia; controle da qualidade de produtos e serviços; e implementação de programas sociais. Tudo feito por uma força de trabalho de 12 mil pessoas.

A Fiocruz tem sua base fincada num campus de 800 mil metros quadrados no bairro de Manguinhos, na Zona Norte do Rio de Janeiro. Em torno dos três históricos prédios do antigo Instituto Soroterápico Federal – o Pavilhão Mourisco (o famoso Castelo da Fiocruz), o Pavilhão do Relógio e a Cavalariça –, funcionam a maior parte de suas unidades técnico-científicas e todas as unidades de apoio técnico-administrativas.

A Fundação está instalada em 10 estados e conta com um escritório em Maputo, capital de Moçambique, na África. Além dos institutos sediados no Rio de Janeiro, a Fiocruz tem unidades nas regiões Nordeste (Pernambuco e Bahia), Norte (Amazonas), Sudeste (Minas Gerais), Centro-Oeste (Distrito Federal) e Sul (Paraná). Mantém escritórios no Ceará, Mato Grosso do Sul, Piauí e Rondônia. Ao todo, são 16 unidades técnico-científicas, voltadas para ensino, pesquisa, inovação, assistência e desenvolvimento tecnológico. Há ainda uma unidade descentralizada, em Brasília. E 4 unidades técnico-administrativas dedicadas ao gerenciamento físico da Fundação, às suas operações comerciais e à gestão econômico-financeira e de recursos humanos. Mas a Fiocruz está em todo o território brasileiro, por meio do suporte ao SUS, na formulação de estratégias de saúde pública, nas atividades de seus pesquisadores, nas expedições científicas e no alcance de seus serviços e produtos.

Fiocruz em números

A Fiocruz é hoje a instituição pública brasileira com o maior número de Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo (PDPs) e conta com 50 laboratórios de referência e departamentos articulados em redes internacionais para a solução de problemas de saúde pública. É também a maior produtora mundial da vacina contra a febre amarela, mantém parcerias com instituições de pesquisa de 50 países e coordena a maior rede mundial de bancos de leite humano, que reúne também outros países. A Fiocruz é ainda a maior instituição não-universitária de capacitação e formação de recursos humanos para o SUS.

A Fiocruz produziu, em 2019, 129 milhões de doses de vacinas e 116 milhões de unidades farmacêuticas. Forneceu 243 milhões de unidades farmacêuticas, 9 milhões de frascos e seringas de biofármacos e 6 milhões de reativos para diagnóstico. Fez também 5 mil análises de qualidade de produtos de saúde, 82 mil pacientes tratados, 312 mil testes de referência laboratoriais.

A Fundação tem 43 programas de mestrado e doutorado (stricto sensu) e 46 cursos presenciais de especialização (lato sensu), mais de 7 mil egressos de pós-graduação (stricto sensu e lato sensu) e mais de 3,5 mil egressos de educação profissional. São 29 linhas de pesquisa, mais de 2 mil artigos científicos publicados e mais de 2,5 mil projetos de pesquisa e desenvolvimento.

 

Fonte: Portal Fiocruz de Notícias