Fome, Epidemia e Mobilização Social. A partir deste mote, a Fiocruz promoveu na última segunda-feira, 04 de abril, intenso debate sobre o enfrentamento da pobreza e dos determinantes sociais da saúde, à luz da memória do sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, ícone da militância pelo combate à fome pela garantia dos direitos universais. Realizado em comemoração pelos 30 anos do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict) e da Casa de Oswaldo Cruz (COC), o evento reuniu especialistas em Saúde, Educação, História, Comunicação e Economia, além do filho de Betinho, Daniel Souza.
O debate foi impulsionado pela exibição do filme “Betinho – A Esperança Equilibrista”, dirigido por Victor Lopes, que conta a trajetória do sociólogo, fundador da inciativa Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida. A programação também contou com duas aulas inaugurais: “Cuando los enfermos se organizan, protestan y hasta hacen huelgas”, com o professor de História da América Latina do Swarthmore College, o argentino Diego Armus, e “Do combate à fome à superação da pobreza”, com o economista Francisco Menezes, consultor do Programa Mundial de Alimentos da Organização das Nações Unidas (ONU).
O coordenador do Centro de Relações Internacionais da Fiocruz e ex-presidente da Fundação, Paulo Buss, comentou sobre a importância das duas unidades desde o contexto em que foram criadas. “Em 1986, a Fiocruz teve a ousadia de criar estes dois institutos. Criar o Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde e a Casa Oswaldo Cruz não foi algo trivial. Àquela época ninguém debatia sobre a história da saúde ou as questões envolvendo a comunicação e a informação na área. As duas unidades tiverem um papel preponderante na constituição desses campos de conhecimento e atuação direta na defesa da saúde como direito de todos”, enfatizou Buss.
Betinho e a saúde pública
“Recuperar a memória de Betinho é fundamental para atravessarmos o atual momento político do país. O filme traça um painel da história recente do Brasil, com uma projeção contundente para o futuro, e aborda a questão da comunicação e da informação como chave para chegarmos aos corações e mentes e evitarmos situações de exclusão e a falta de diálogo. Militante ativo pelos direitos civis, ao longo de sua vida Betinho nos ensinou sobre a importância de mobilizar as pessoas, toda a sociedade, para chegar às conquistas sociais que hoje estão ameaçadas. É este trabalho que devemos continuar”, avaliou o jornalista Umberto Trigueiros, diretor do Icict.
O sanitarista José Carvalho de Noronha, pesquisador do Icict e coordenador executivo da rede Brasil Saúde Amanhã, complementou: “o principal legado deixado por Betinho é a solidariedade. Criticado por muitos justamente por isso, ele nos ensinou, com a generosidade de sua alma, que a mobilização social pode e deve – por que não? – ser carinhosa. A luta pela justiça é uma condição que vale a pena e dá sentido à vida. O filme me encheu de emoção e esperança. As sementes de solidariedade e de luta plantadas por ele são permanentes e não passarão de uma hora para a outra. Muito obrigado, Betinho”.
Noronha lembrou, ainda, que foi a luta pela proibição da comercialização da doação de sangue que trouxe ao Estado o dever de garantir e prover serviços de saúde de qualidade e com segurança. “Lutamos pela não comercialização do sangue, pela Constituinte e pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Agora, argumentam que a Constituição Federal não cabe no orçamento. O que existe, hoje, é um desmonte da pactuação social, que em última instância levará à inibição dos movimentos pela cidadania. Nós, pessoas e instituições comprometidas com a democracia e o direito à saúde, precisamos manter e reforçar nossa luta”, afirmou o sanitarista.
Presente ao evento, o filho de Betinho, Daniel Souza, reconheceu a habilidade do pai em mobilizar a sociedade. “Seja em uma campanha contra a fome ou contra a Aids, Betinho conseguia colocar na mesma mesa direita, esquerda, governo, sociedade civil, gente de várias religiões, com diferentes pensamentos. E conseguia dialogar com todos. Ao meu ver, isto é o que mais precisamos, atualmente, no Brasil”, concluiu.
Equipe Brasil Saúde Amanhã – Bel Levy – 11/04/2016